A escrita da história do Brasil nos séculos XVIII e, sobretudo, XIX é bastante marcada pelo recurso às crônicas de viajantes estrangeiros como fontes documentais paraetnográficas da sociedade da época. Cientistas, artistas, botânicos ou exploradores europeus são figuras freqüentes na paisagem literária, histórica e historiográfica do Brasil dos Oitocentos (J. B. Debret, J. M. Rugendas, J. B. von Spix, Thomas Ewbank, entre tantos outros). Várias de suas narrativas foram publicadas à época e são incessantemente reeditadas até hoje. Relatos como o do imã iraquiano em línguas não-europeias sobre o Brasil colônia e império, são, entretanto, muito incomuns.
Até onde se sabe, Al-Baghdádi foi o primeiro imã árabe a chegar ao Brasil, produziu o único registro do olhar árabe sobre o Novo Mundo no século XIX e marca a primeira chegada de um navio originário do Império Turco-Otomano em terras brasileiras, em 1866. A narrativa de sua viagem é, em si, interessante e complexa. Sua estada entre Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco durou cerca de três anos (1866-1869). Seu relato registra as impressões a partir de um estilo narrativo bastante rico e
caracteristicamente árabe e muçulmano, a Rihla. Este gênero combina narrativa histórica, geográfica, etnográfica, sociológica e literária, misturando o fantástico e o verossímil e ajudando a mapear conexões complexas entre viagem, conhecimento e teoria. De fato, a associação entre viagem, experiência e conhecimento não é estranha ao contexto protestante anglo-saxão ou germânico, de onde se origina boa parte dos viajantes estrangeiros que circularam pelo Brasil do século XIX.
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